segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

Sobre o encontro de Copenhague

O secretário do Meio Ambiente do Estado de São Paulo, Xico Graziano, já está de malas prontas para viajar junto com a comitiva brasileira para Copenhague, onde serão discutidas propostas para redução da emissão de gases causadores de efeito-estufa. Apesar das promessas dos principais países poluidores de chegar à Dinamarca com metas para a diminuição da emissão de CO2, o engenheiro agrônomo não está empolgado com as negociações dos termos da segunda parte do Protocolo de Kyoto: "Será um processo muito complicado, de alto grau de enrolação". Nesta entrevista, concedida em seu gabinete em São Paulo, o ex-presidente do Incra (1995) acredita que as práticas de sustentabilidade só farão sentido para o mundo se elas estiverem atreladas a interesses econômicos. "Ninguém produz etanol porque é ecologista. O etanol é produzido porque dá dinheiro", exemplifica. Leia abaixo os principais trechos da entrevista:

EXAME - Qual será o maior prejuízo das mudanças climáticas para o Brasil caso o país não adote posturas mais rígidas de preservação do meio ambiente nos próximos anos?

Xico Graziano - O governo federal não tem a visão de que o enfretamento da agenda das mudanças climáticas criará novas oportunidades para a economia brasileira ao invés de se opor ao crescimento. Eu acho que ainda prevalece no governo federal a visão conservadora de que essa agenda é restritiva ao crescimento. A minha visão não é essa. A agenda de descarbonificar a economia vai criar novas alternativas de um novo padrão que tem a ver com novas empresas - ou com as empresas atuais, se elas renovarem suas tecnologias. O etanol é energia renovada e está gerando empresa e renda. Infelizmente, o presidente Lula ainda cede ao lobby do petróleo e dos setores mais conservadores da economia, permanecendo de mãos atadas.

EXAME - Há estimativas de que, para o Brasil, o custo da negligência com o meio ambiente seja de 3,6 trilhões de reais até 2050.

Xico Graziano - E é um prejuízo e tanto, não acha? Sem contar os impactos naturais no país. O nível dos oceanos poderá subir. Podemos ter problemas de zona litorânea, não como a Índia terá, ou como as ilhas pacíficas terão. Mas vamos ter problemas desse tipo. A savanização da Amazônia também é projetada. A desertificação do nordeste, idem. Serão terríveis as conseqüências...

EXAME - O senhor acha que um dos motivos da savanização da Amazônia é a falta de fiscalização?

Xico Graziano - Acho que falta mais manutenção de uma economia numa região onde vivem 25 milhões de pessoas, voltadas às atividades madeireiras, agropecuárias e de subsistência. É claro que falta fiscalização porque cada vez mais existe roubo de madeira. Mas faltam alternativas econômicas para essas famílias, que há 100 anos estão vendendo móveis como este (bate com a mão direita em sua mesa de madeira).

EXAME - Quais seriam essas alternativas econômicas?

Xico Graziano - Temos de criar um bolsa-floresta para remunerar essa população...

EXAME - Como assim?

Xico Graziano - Ao invés da pessoa fazer serralheria, ela teria outra atividade de subsistência oferecida pelo governo. É claro que não dá para ignorar que a madeira é exportada e rende dólar para o Brasil. Mas temos de pensar em uma forma de substituir a economia atual na região por outra mais eficaz, ecologicamente falando.

EXAME - O senhor acompanhará a comitiva brasileira na reunião de cúpula em Copenhague. Qual é a sua expectativa para esse encontro com autoridades mundiais?

Xico Graziano - Desde o começo, a minha expectativa sempre foi mediana. A minha experiência de acompanhar negociações internacionais se deu dentro dos acordos da Organização Mundial do Comércio (OMC). Sempre achei esse processo muito difícil e complicado, de alto grau de enrolação. Eu me surpreenderia caso fosse definida uma meta mundial em Copenhague. Não dá para combater o aquecimento global apenas com um tratado. O acordo é importante porque vai obrigar países a mudarem a suas posturas em relação à preservação do meio ambiente, criando legislações próprias para isso. A minha visão desse processo é que os setores de ponta da economia mundial já estão percebendo o que vai acontecer. Com isso, já estão fazendo as mudanças, independente de Copenhague.

EXAME - E como o senhor avalia a proposta do Brasil diante dessa reunião?

Xico Graziano - O governo federal deveria ter discutido esse assunto há seis meses. Assim, o presidente poderia ter pressionado outros países a aderir à mesma causa. O governo federal não percebeu a importância da discussão e ficou apático. Ultimamente, o Brasil tem se pautado muito na decisão de outras nações em desenvolvimento. O governo federal espera elas agirem para depois determinar sua ação.

EXAME - Em sua opinião, qual deveria ser o papel do setor privado na preservação do meio ambiente?

Xico Graziano - O objetivo do empresário é lucrar e competir. As empresas só terão práticas de sustentabilidades quando "apanharem" da sociedade. Sinceramente, não acredito em empresário bonzinho. Ele adota práticas de sustentabilidade dentro de uma competição, ou pressionado pela sociedade, ou ainda pela legislação. Eu não tenho visão idílica sobre esse assunto. E certamente empresários mais inteligentes encontrarão na preservação do meio ambiente uma forma de ganhar dinheiro. Por exemplo: para que serve o selo verde? Para vender bem o produto no mercado. Ora, ninguém produz etanol porque é ecologista. O etanol é produzido porque dá dinheiro. É claro que há uma consciência mundial de que deveria haver cortes nas emissões de CO2 nas próximas décadas. Mas a questão é: como colocar isso na cabeça dos empresários? É algo em que o governo federal deveria pensar.

EXAME - O senhor defende cortes nas emissões de gases poluentes nas próximas décadas. Mas, até lá, as tecnologias verdes estarão suficientemente desenvolvidas?

Xico Graziano - Terão de estar. Tirando alguns grupos de pesquisas isolados, o Brasil está muito atrasado. Os Ministérios do Desenvolvimento e a pasta de Ciência e Tecnologia deveriam incentivar mais estudos de desenvolvimento da tecnologia verde.

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